Meu Amigo do Ônibus

Desde novembro do ano passado, eu pego o mesmo ônibus no mesmo ponto e no mesmo horário para ir trabalhar. Já passei por 3 empregos diferentes mas o ônibus e o horário continuam os mesmos. E o cara também continua o mesmo. Mas, cara? Que cara?

É, tem um cara que, durante todo esse tempo, me acompanha pegando o mesmo ónibus todo santo dia. Ele sempre está de terno e gravata indo pro trabalho, é narigudo e tem cara de nerdinho. Parece ser super sério, responsável e correto. Nunca reparei muito nele, por ser a pessoa mais neutra do mundo, mas conforme o tempo passava e as pessoas de sempre iam mudando e/ou sumindo, ele nunca mudava muito menos sumia. Sempre estava ali, com a mesma cara, mesma roupa, o mesmo corte de cabelo e o mesmo ar de…’nada’.


Eu consigo imaginar a vida inteira dele na minha cabeça: é noivo de uma nadinha também [pois ele usa aliança de ouro na mão direita], deve trabalhar com algo bem chato tipo contabilidade ou administração, e sai pontualmente às 18 horas para ir pra casa. [durante o almoço eu encontro ele nas mediações de Pinheiros, pois descemos no mesmo ponto também e saímos para almoçar no mesmo horário]. Como eu sei que ele sai as 18? Porque eu também saio, e encontro o dito cujo no ponto para irmos pra casa juntos – descendo no mesmo ponto de novo.

É engraçado pois eu sinto como se o conhecesse intimamente. Eu sei que ele existe, e fico feliz quando o vejo no ponto de manhã ou quando entro no ôbinus para voltar pra casa e ele está passando pela catraca. Gosto quando vejo ele dando um sorriso e me sinto segura com a presença dele. Me faz sentir menos solidão, sabe?

Ele também sabe que eu existo. E, se for como eu, também deve imaginar minha vida toda. Nunca rolou nada de olhares, paquerinha…Mesmo porque, além dele ser comprometido, ele é feinho e não me atrai em nada. Muito pelo contrário! Eu sinto que se o conhecesse, iria achá-lo muito chato. Ele deve ser a pessoa mais sem graça do mundo para se ter uma conversa. Não deve ter coisas engraçadas para contar, não deve se interessar pelas coisas que eu gosto e deve ser aquelas pessoas que ficam esperando você arranjar um assunto para manter uma conversa.

Mas mesmo com tudo isso, eu sentia que precisava fazer alguma coisa por ele. Mesmo morrendo de medo, resolvi fazer um mini-livro. Na capa desenhei ele e dentro escrevi assim: “Sempre quis saber seu nome, onde mora, o que faz, com que trabalha e se é feliz ou triste…Mas não me conte! Se não perde toda a graça!”. Pensei muito antes de entregar. Qualquer passo em falso poderia fazê-lo vir falar comigo ou se afastar pensando que eu queria dar uns amassos com ele. Na verdade, o que eu queria mesmo era mostrar pra ele que eu percebia a existência dele no mundo e fim.


Dias tomando coragem e passando por alguns desencontros, desci do ônibus antes dele e quando ele deseu eu disse: “Oi, fiz uma coisa pra você…” [entregando o mini-livro em sua mão]. Ele pegou, meio que sem entender nada e antes que pudesse esboçar uma reação,eu disse sorrindo: “Tchau!” – ele deu uma risadinha tímida e disse: “Tchau..” [foi a primeira vez que ouvi sua voz]

Andei até o trabalho sem olhar para trás. No dia seguinte de manhã, subi o escadão e quando enxerguei o ponto ele estava lá, como sempre igual. Eu não sabia muito bem como me comportar, mas chegando perto dele, fui recebida com um lindo sorriso. Retribui com outro e fui mais pro lado. Fiquei ali estática, pensando o quanto foi legal ele não ter vindo falar comigo mas ter sido singelo dando um sorriso.

Desde entao, sempre que nos encontramos, trocamos sorrisos e ele até já se arriscou a me dizer “bom dia”.

24 Comentários

Arquivado em Comportamento, Cotidiano, Eu, Relacionamentos

24 Respostas para “Meu Amigo do Ônibus

  1. e eu continuo esperando pelo final de comédia romântica.

  2. ah, agora entendeu o mini-livro! :o)

  3. Andrea Hiranaka

    Re, essa história já virou novela e a gente espera os próximos capítulos!

  4. eu gosto assim, amelie.

  5. Leo Lucciola

    Estou pra ver um puto que não tenha uma histórinha de condussaun! Eu amo os amores instantâneos de metrô que sempre me geram uma distração matinal para amenizar a dor de se andar no transporte público em SP! Ok superficializei totalmente toda a sua profundidade mas é um dos aspectos de toda a história okjáfaleidemaisbjo!

  6. brunetta

    ponto fora da curva

  7. brunetta: não entendi [?]

  8. brunetta

    pode entender como um elogio =)

  9. maravilhas empáticas.

  10. pamela cabral

    essa foto é dele!?

    😉

  11. Pamela,

    é ele sim…você o conhece? imagina que massa? mas eu não iria querer saber nada sobre ele =X

  12. uau!
    hahahahahhahaha
    vc tirou uma foto dele! com celular, suponho! =F

    até! =*

  13. hauahua q bonito isso!!!!

  14. Caio

    Re, adorei a idéia do minilivro. Vou copiar.
    Pessoas desconhecidas nos ônibus me fascinam. O que terá por trás de seus olhareS? Histórias de vida diferentes…

    um beijo, adorei seu blog.

  15. Caio

    Adorei a idéia do Minilivro, vou copiar. 😀
    Sempre fico obersvando as pessoas com quem pego ônibus. Imaginando as histórias de cada um sabe.
    Até mas Rê.
    adorei o Blog.

  16. Jecona

    Po! Adooreeeei! hahaha
    É, todo mundo já teve/tem/terá um ‘desconhecido íntimo’ e cá entre nós, esse ae é bem gatchénho! HUSHUSUHAUSHHUASS

  17. Matheus

    Adorei!

  18. marhyana lemos

    oi.
    eu vi sua história na comunidade “desconhecido íntimo”,e resolvi saber mais um pouco.

    muito bonita a história.
    me emocionei! *.* haha

    beijos e bons encontros com seu colega
    de ônibus.

  19. Valentina

    Gostei tanto da tua história. Beijos.

  20. ain… que coisa mais linda meu deus!!! Rebis Polain!!

  21. gean

    Qdo der vontade d conhecer alguém nao entre em chats, pegue um ônibus.
    🙂

  22. agora que eu vi de onde vc tirou a frase: qnd der vontade de conhecer alguém não entre em chats, pegue um ônibus.
    a melhor historia de como surgiu um mini-livro.
    😀

  23. larissa

    nossa achei linda sua historia,
    nao tem mais? auahuhaua

Deixe um comentário